Idosas do Abrigo Bom Jesus ultrapassam 100 anos com atividades e respeito a particularidades

Qual é o segredo para chegar aos 100 anos? Essa pergunta não tem uma resposta exata, mas para a idosa Beth, de 71 anos, o segredo é estar sempre em atividade e ter um humor agradável. E é esse o legado que a Fundação Abrigo Bom Jesus de Cuiabá tem deixado. A prova desse empenho são as três idosas abrigadas no local que já ultrapassaram o centenário.

Arminda da Silva, 111 anos; Maria Eugenia Fernandes, 105 anos, e Donata da Silva, 104. Essas são as senhoras que passaram dos 100 anos muito bem cuidadas pelo Abrigo, que recentemente completou 83 anos de fundação. Elas possuem toda uma rotina de cuidados.

Elisabeth Peixoto de Oliveira, carinhosamente chamada de Beth, mora no abrigo há 9 anos. No lugar, ela mantém a mente ativa realizando pinturas em panos de prato e cuidando fielmente das plantas. Algumas plantas, dona Beth recebeu de pessoas que frequentam a fundação. A senhora ainda vende os panos e usa o dinheiro para manter itens de conforto, como um ventilador. Para ela, o humor também é uma parte importante com o avançar da idade.

“Nunca ficar com cara feia. Porque cara feia, principalmente para a gente, é ruim e pros outros também. E as energias negativas tão aí. Então, a gente tem que emanar positividade, acreditar em Deus […] Emanando amor, a gente recebe amor”, diz Beth.

O abrigo tem 62 funcionários e 22 cuidadores que se dedicam aos abrigados. No local, moram 82 idosos. A monotonia não tem vez no ambiente, isso porque muitas atividades são oferecidas aos moradores. O abrigo faz questão de adequar os passeios e atividades às individualidades de cada abrigado. A ação faz toda a diferença, já que muitos idosos não recebem visita da família. A quebra de rotina acaba os acolhendo ainda mais e trazendo aconchego.

Senhor Orlando Diogo da Silva gosta de pescar desde jovem. Hoje em dia, aos 62 anos, ele não quer perder essa paixão. Ele já foi duas vezes pescar em um passeio organizado pela fundação. “Peguei só dois pacu”, conta ele, não muito contente com a quantia. O senhor aguarda ansiosamente outra pescaria, que está sendo programada por volta do dia 2 de março.

Dona Júlia é vaidosa e sempre tem os pedidos atendidos. Ela não gosta de cabelos brancos. Quando o cabelo começa a esbranquiçar, ela já pede tinta preta. Ela não sabe olhar as horas, mas não gosta de ficar sem relógio. E o objeto precisa estar funcionando para ela usar, os ponteiros não podem estar parados.

Senhor Nenê gosta de comer churrasco e já saiu algumas vezes em passeios com o abrigo. Ele reforça que gosta de carne de touro, pois, segundo ele, carne de touro é mais forte. Uma vez por mês um voluntário vai visitar os abrigados para cozinhar para eles. “Cadê? […] sumiu”, cobra senhor Nenê.

Senhor Pedro é palmeirense e acompanha os jogos no abrigo. Ele assiste aos jogos do time dele e dos outros funcionários. Quando os outros times perdem, ele faz questão de tirar sarro dos trabalhadores. Mas ele reforça que, hora do respeito, tem que respeitar e, a hora para brincar, pode brincar, sem extrapolar.

Rudy é de São Bernardo do Campo (SP) e mora na fundação há 2 anos. Ele contou que gosta muito de leitura e faz poesias, poemas e acrósticos. Ele mostrou para equipe do HNT alguns de seus poemas e fala que ‘viaja’ nessas coisas.

Suzeth Nascimento, carinhosamente chamada de Suzy, é coordenadora de eventos da fundação. Ela conta a importância de valorizar e respeitar os gostos de cada idoso. “O nosso trabalho é tentar ver […] o que que ele quer fazer, qual que é o sonho dele, qual é a vontade dele […] É dar essa dignidade, essa qualidade pra eles”, conta ela.

ATIVIDADES

Além dos passeios, a fundação realiza outras atividades, como caminhada, musicalidade e artesanato. O local recebe uma programação em que cada dia há uma atividade diferente. “Já vive no isolamento. Então, aqui a gente procura fazer que os dias sejam dias cada vez melhores. Porque muitos não têm expectativa de futuro e nem de vida, né?! Porque muitos não têm vínculo familiar […] Então, ele não tem muita expectativa de sair daqui, de fazer outras coisas”, pondera Suzy ao falar das programações.

Os passeios e eventos são programados logo no começo do ano. Os funcionários buscam apoio de voluntários que queiram colaborar com a realização dos desejos dos idosos, como um simples almoço em um restaurante no shopping. O abrigo não tem condições financeiras para arcar com todos os custos, por isso, a equipe vai atrás de doações.

“Eu falo: a gente tem uma liberdade de ir e vir que a gente não dá valor. Porque você planeja umas férias, você planeja um passeio. Você planeja um monte de coisa. Eles não… se não é nós fazer (sic) isso por eles, eles vão ficar até o dia da morte sentados ou deitados numa cama”, comenta a coordenadora.

Suzy expressa que hoje em dia tem um olhar diferente sobre a situação dos idosos. “Antes de eu vir trabalhar aqui, eu condenava quem deixava. E, hoje, eu tenho um olhar diferente. Eu condeno quem abandona. Porque muitas vezes a pessoa não tem condições mesmo. Porque ele precisa de uma equipe pra cuidar, não é só uma pessoa […] e muitas vezes a família não tem condições”, explica.

A coordenadora impulsiona as famílias ainda a manter os laços familiares com os idosos, já que o convívio familiar é essencial. “Um sábado, um feriado, um domingo de Páscoa, um Dia das Mães. Vem buscar seu pai, vem buscar sua mãe né?! Leva, traz. […] Faz muito bem pra eles. Porque a pior coisa que tem é a rejeição. Você ser rejeitado pela sua própria família”, reforça Suzy.

“A coisa mais importante da nossa vida é criar laço com as pessoas. Ter dinheiro é bom, é importante. Você ter um trabalho é importante. Você ter uma profissão é importante, mas laço familiar… esse laço, ele tem que existir. Acho que se todo mundo passasse a pensar nisso, a gente viveria bem melhor”, ressalta Suzeth.

A Fundação Abrigo Bom Jesus recebe grupos que visitam os abrigados, muitos levam lanches e cantam. Também é possível ir ao local individualmente visitar os idosos. Para quem quiser realizar visitas, é só agendar o horário através dos números (65) 9 8112-0188 / 3644-1706. Os telefones também podem ser contactados caso alguém queira oferecer algum tipo de doação.